domingo, 27 de fevereiro de 2022

Natal na guerra Os hobbies dos militares

 na guerra emMoçambique.

 À noite na Cantina do Silva em Moçambique,

 jogava-se com vício e paixão. No final de cada

 partida estalam ferozes zaragatas. Ávidos, os

vencedores conferem os ganhos, os azarados

soltam pragas e blasfêmias.

 Desconfiam de ter havido batota, suspeita

 agravada pelo efeito do álcool, da liamba,

 e do calor...

Quando algum ficava depenado. Com os bolsos

do camuflado vazios, levantava-se furioso da

 mesa de jogo. Outro tomava já o meu lugar

na mesa da lerpa. O que saía a rosnava insultos,

 a cuspir palavrões. 

As noites são sempre iguais naquel minúsculo

reduto militar no Lago Niassa-Cobbué, quase

paredes-meias com o Malawi e a Zâmbia.

Naquela noite de consoada,a estúrdiam e os

excessos mostramvam-se piores do que nunca.

Quem perdia ficava agastado, rumava para a

caserna deserta, procurava refúgio num

 instrumento de música.

Voltava cá para fora tal como entrara.

Agora, sozinho, caminhava ao longo do arame

 farpado, sob um céu coalhado de estrelas.

 O ar fresco fazia-lhe bem. Sentia-se outro.

Pensava no Natal e olhava para o céu à procura

do astro que guiava aos reis magos.

Apaziguado pela refulgente aletria cósmica,

esquecia a batota, as minas, as emboscadas.

Esquecia a picada, esse palco de guerra e

 tragédias ali bem à vista.

Subitamente um vagido sobe no ar, enchendo

 de sentido a noite.

A poucos metros, numa palhota para lá da

cerca de arame farpado, nascia um menino.

 Um menino negro, entre palhas! 

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